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quarta-feira, dezembro 31, 2008

BAMBU COMO ALTERNATIVA ECONOMICA - RE-PUBLISH

O Bambú como alternativa econômica e ecológica para o setor moveleiro e da construção civil.

*Paulo Cardoso

No início, apenas uso estético

Há cerca de tres anos atrás fui convidado a fazer uma palestra cujo tema seria voltado ao Eucalipto como madeira alternativa para o mobiliário no Brasil. O evento foi cancelado e a palestra não saiu, mas da pesquisa que fiz, brotou uma fascinante descoberta que mudou completamente o rumo de minha visão como designer e como ser humano preocupado com o que resta de ve4rde e agradável neste mundo capitalizado. E foi aí que percebi o quanto a globalização fez bem às minhas pesquisas e ao novo prisma que passei a enxergar, baseado na palestra que não aconteceu. Descobri o Bambú.

Mas não foi ao acaso, nem por calmaria de idéias, que comecei a pensar me bambú desta forma.

Um pouco antes disso, eu andava pelas estradas entre o Rio Grande do Sul e SC, e via os índios Caigangues à beira do caminho vendendo seus balaios e apetrechos artesanais. Comprei algumas peças e comecei a observar a dinâmica do design daquelas peças. Sua simplicidade lógica das combinações geométricas, a delicadeza das fibras e comecei a imaginar um modo de transformar aqueles desenhos em móveis, e encontrar uma forma de reproduzí-los seriadamente seria o desafio, pois, se de um lado, eu não poderia contar com mão-de-obra indígena para fazê-lo, dadas as complicações sociológicas e legais, por outro lado também não gostaria de me apropriar de seu know-how. Desisiti dos desenhos então, e a coleção que criei pensando nisso ficou na gaveta onde descansa em paz até hoje.

Mas aquelas fibras longas e perfeitas, maleáveis e firmes não me saíam da lembrança. Comecei então a buscar toda informação que pudesse recolher sobre uso industrial de bambú. Pesquisei sites brasileiros, fiz contatos com ONGs, Universidades, me informei com colegas do design, arquitetos, engenheiros florestais, IBAMA, EMBRAPA, enfim, varri o Brasil em busca de informações mais precisas sobre bambú. Busquei em sites internacionais, mas nada havia que me pudesse oferecer respostas sobre uso industrial do bambú. Até então, não se falava em Piso de Bambú. Era apenas bambú. E tudo o que encontrei foram trabalhos bastante empíricos feitos por ONGs no setor da arquitetura alternativa e artesanato. Nada mais que isso.

Numa conversa informal, descobri que havia um empresário trabalhando com Parquês de bambú no interior do Rio Grande do Sul. Consegui o endereço e telefone, e fui atrás. Fui recebido com indiferença, e apenas fui informado que ele estava tentando estabilizar o bambú para a fabricação do piso, e que quando estivesse estabilizado, me enviaria uma amostra. Passaram-se dois anos já e a amostra nunca apareceu. Ou ele não estabilizou, ou esqueceu de mim. Mais provável o segundo. Mas foi aí que ouví pela primeira vez a associação de bambú a piso.

Tentei imaginar como deveria ser,e na minha mente via tramados, curvas, superfície arredondada, irregular, muita resina, cola, etc. Nada mais. Descobri então que no imaginário das pessoas, falar em bambú, nada mais é que falar em artesanato, rusticidade e formas cilíndricas ornadas de colmos.

Neste período, tinha um amigo estudando em Shangai, fazendo MBA. Por estar longe da família, meu amigo conversava comigo todos os dias por skype. E numa destas conversas, falamos sobre piso de bambú. Para minha alegria, ele me informou que na China havia uma fábrica ao lado da outra deste material. Que lá bambú era artigo próprio da cultura e da economia, e que piso , mobiliário e construção usando bambú era corriqueiro. Passamos então a tratar com mais afinidade o assunto. E descobri que apenas o Brasil desconhece este material, pois a Europa, Ásia e América do Norte já o utilizam em larga escala, e a Guatemala já está começando a fabricação de painéis e pisos de bambú.

Relação com as madeiras tropicais

Ao buscar informações de mercado sobre as vantagens econômicas do eucalipto e pinus sobre as madeiras da amazônia, fui perceber a nuvem escura que se aproxima do universo da madeira e todos os seus derivados, chamado “Apagão Florestal”, um hiato de abastecimento que iniciou em 2003 e vai se agravando a cada ano, chegando, segundo os especialistas, até o ano de 2030. Isso se a demanda da madeira não evoluir acima da previsão mundial. Teremos então um vazio de oferta na ordem de 30 % ou mais, considerando que a madeira seja a matéria-prima base de incontáveis aplicações industrias: papel, MDF, aglomerado, compensado, OSB, fralda descartável, essências, energia, carvão para siderurgia (e aí vamos trafegar num terreno que vem crescendo, o dragão chinês que esteve adormecido por milênios e justo agora, na nossa geração, começa a despertar e despertar com fome de dragão que dormiu por milênios e despertou com fome).

Buscando conhecer além do eucalipto e pinus, trafeguei pelo mercado das madeiras tropicais, e assustadoramente conheci os caminhos por que percorrem as madeiras que saem da Amazônia e chegam ao Oriente e à América do Norte em quantidades astronômicas, incalculáveis.

A presença de um amigo brasileiro vivendo na China me abriu uma porta, embora óbvia, mas que continuava obscura: o trabalho com o bambú. E foi a partir disso que passei a receber elementos para minha pesquisa. No princípio, trafeguei apenas pelo campo da curiosidade profissional, mas com o passar do tempo e com o que avançava em conhecimento, tive a certeza que me encontrava diante de algo que poderia mudar o cenário da indústria madeireira no Brasil. Era algo grande, original e mais que tudo: era um produto testado pelos maiores mercados do mundo.

O bambú – Fonte de 1200 aplicações de consumo

Os chineses conhecem mais de mil maneiras de utilização do bambú, que não cabe aqui mencioná-las. Apenas para constar que é da natureza talvez um dos produtos de maior variedade de aplicações. Vou me deter em algumas delas, em especial a fabricação de painéis e pisos.

Corre também o mito que utilizando bambú como insumo industrial, estamos contribuido para a extinção dos pandas, o que é uma grande inverdade, pois as espécies mais conhecidas empregadas para fabricação de pisos e outros produtos são a Phyllostachys pubescens e a Gradua Angustifolia, enquanto que o panda se alimenta exclusivamente de uma espécie, que é auma espécie do gênero Fargesia.

Há na verdade cerca de 180 espécies aproveitáveis para uso industrial, das 1.100 existentes, e nos importa saber que o Brasil possui quase todas estas espécies, particularmente as duas apresentadas. Temos também uma terceira que poderia ser ainda mais utilizada, a Gradua Angustifolia Gigantis, cujo diâmetro pode ultrapassar os 200mm. Quase todas elas crescem cerca de 25 metros por ano e atigem cerca de 40 metros de altura em dois anos, dependendo do solo e das condições ambientais. Podem ser cortados em 4 a 5 anos e não nacessitam replantio, pois como são gramíneas, obedecem a um comportamento parecido com a grama de jardim. É só cortar, e cortar, e cortar.

Ecologicamente correto

Não é exagêro afirmar que o bambú é uma das espécies que menos danos causam ao ambiente, ou pelo contrário, oferecem alimento e abrigo a pequenos animais, como ratos, pássaros, aracnídeos e outras espécies. Um bambuzal é um ecossistema perfeito, pois mantém umidade, temperatura e oxigenação adequadas.

Uma vez plantados os rizomas, o bambú demora cerca de 5 anos para estabilizar suas raízes no solo. Durante este período, não cresce mais de 80 a 120 cm. A partir disso, passa a crescer normalmente, como já foi dito e seu ciclo começa. É portanto também economicamente viável, se comparado com outras espécies como eucalipto ( 30 anos) e pinus (25 a 30 anos) para que sejam totalmente aproveitados para uso da madeira.

Economicamente correto

O metro cúbico do bambú é vendido no Brasil a cerca de R$ 1900,00 ao consumidor final, isto é, acabado, pronto para uso (em forma de piso S4S com verniz UV). Comparado a ele, temos o ipê, que, além de ser espécie amazônica com os dias contados, junto de outras, demanda um excessivo cuidado na colocação, cura, colagem, lixação e pintura, e muitas vezes para que em seis meses estajea completamente empenado pelas variaçãos de clima, temperatura e teor de umidade no ambiente.

O bambú, por ser fervido durante tres dias, e ainda passando por autoclavagem e estufa, é completamente estabilizado, suportando uma variação de 25ºC sem deformar.

É facílimo para usinagem, pois como toda a resina foi dissolvida, o que seria um fator a contribuir para a empenação, restam somente fibras, as mais longas do reino vegetal. E fibra é sempre fibra. Boa para comer, boa para trabalhar. Respeita fresa, serra e outros instrumentos de corte. Evidente que como todo material, requer cuidados, pois por ser fibroso, pode lascar nas pontas, o que é facilmente solucionado com uma lixa.

O Brasil pode produzir painéis de bambú, pois temos tecnologia, matéria prima e mercado. Só falta vontade mesmo. Evidente que a vontade vem do conhecimento e o conhecimento do que se vê no mercado. Desta forma, fui buscar na fonte o que há de melhor em bambú, e consegui comover um investidor a apostar na idéia. Mas o caminho ainda é longo e precisamos formar uma cultura de uso deste material, que espero seja pela convicção e consciência e não pelo desespero, no momento em que cada vez menos espécies de árvores da amazônia estiverem disponíveis no mercado. E cada vez mais as matas tropicais forem substituídas por pinus e eucalipto, causando danos irreparáveis à natureza. Não sou contra estas espécies, mas acredito e estou comprovando que esxistem outras que podem ser agregadas e outras mais virão com as pesquisas. Mas ao menos economicamente, está provado que bambú pode melhorar a economia, as florestas e se não formos muito pessimistas, um pouquinho do mundo também.

Informações obtidas nos seguintes sites:

www.bambubrasileiro.com

www.eco-bamboo.com

www.dassobamboo.com.cn

Também com os fornecedores na China, com quem mantemos contato.

Paulo Cardoso

Designer