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sábado, novembro 06, 2010

O CASO DA SOGRAJul 3, '05 9:39 AM
for everyone
Demerval não era cego. Demerval não era louco. Demerval sabia tudo o que estava acontecendo com sua vida, a começar com sua casa. Ou, melhor, a casa da sogra, onde morava.Naqueles tempos bicudos e com salário de professor de geografia em escolinha publica, Demerval sabia que era um abençoado em ter onde morar sem pagar aluguel, condomínio nem IPTU. Por isso nunca reclamava. Chegava sempre no mesmo horário, saía na mesma hora e comia as mesmas coisas. Sempre. Todo dia. Menos domingo, que tinha salada de maionese com carne de panela e spaghetti. Tudo feito pela sogra, pois afinal, demerval morava na casa da sogra.Não era uma sogra ruim. Era até boa. Muito boa, pra dizer bem a verdade. Era diferente do conceito pré definido que devem ter todas as sogras. Ainda jovem, esbelta, bem cuidada, a sogra(por razões éticas, prefilo me referir à ela apenas pelo título: sogra) era uma mulher fina e delicada. Tinha as mãos ainda macias, a pele firme e um belo sorriso. Não era um sorriso qualquer, mas costumava sorrir com o olhar. Sorria quando andava e sorria ao permanecer calada. E ele não deixava de perceber isso, o que também o fazia emitir um orgulhoso e discreto sorriso.E assim passavam os dias de demerval. Pode-se dizer que, embora vivendo na casa da sogra, porque a doçura dela o deixava feliz. Demerval era feliz. Mesmo tendo sido deixado pela mulher havia mais de cinco anos. Restara-lhe o verdadeiro amor de sua vida: a sogra. Ela tinha sido sua professora de primário. Sempre linda e meiga. Um encanto. Com oito anos de idade atrevera-se a pedi-la em casamento. Ela respondeu um esperançoso “talvez, um dia”. E ele acreditou. Os anos se passaram, ela se casou..com outro. Era mais velho que Demerval, mais rico, tinha um carro..e Demerval uma bicicletinha aro 24..impossivel de competir. Mas, o tempo era o Senhor da razão, deixa estar, pensava Demerval.. Choveria na horta dele.O tempo passou. Demerval nunca se casou. A professora teve uma filha. Linda, lourinha, olhos azuis..que cresceu, tornou-se uma bela mulher. Levada, arteira, atrevida. Tudo estava saindo perfeitamente de acordo com o que planejara Demerval.Um homem mais velho, cheiroso, alegre, decente, e ainda conhecido desde a tenra infância da professorinha, nada mais perfeito. E Foi assim que Demerval, depois de muitas flores, presentinhos e presentões, delicadezas, se casou com a filha da sua professora.Um gentleman. Um impagável cavalheiro. Cavalheiro demais. Cercava a esposa com flores. Mas ela queria mais. No âmago da sua juventude feminina, ela queria emoção. Ele dava presentes. Para a esposa..e para a sogra. Convidava a esposa para um jantar íntimo à luz de velas: ele, ela..e a sogra. A sogra adorava. Aquele menino de ouro não a enganara. Doce e cavalheiresco, como o fora sempre desde a primeira série. Era o genro perfeito.Mas não era o marido que sua filha sonhara. Não que fosse descuidado com suas obrigações. Não era. Era pontual, servil, gentil e delicado. Até que um dia ela não aguentou mais e foi-se embora. Queria mais. Queria aventura. Queria um homem normal. Ela se casara com um genro mas nunca teve um marido. Puxa vida. Por que ele não poderia ser só um pouquinho parecido com os outros? Deixar a cuéca atirada no corredor..as meias na mesa de jantar, arrotar à mesa..roncar..dizer palavrões. Por que ele não faltava pelo menos uma vez com o respeito para que ela tivesse uma única oportunidade de jogar tudo na cara dele?Mas não. Demerval era metódico. Matemático. Amoroso. E nem queixar-se à mãe ela podia, porque iria dizer o quê? E logo pra quem. Daí foi-se embora. Só o que sua dignidade machucada lhe permitiu fazer foi deixar uma carta de despedida..em branco. E Demerval ficou só..com a sogra.Não. Demerval nunca mais ousou pedir a professora em casamento. Ela já dissera seu talvez. E esse “talvez” era a certeza de que Demerval necessitava para ser feliz. Mesmo que ao lado da sogra