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sábado, maio 22, 2010

De Teologia e de Saudade



Pacard



Dez mil seitas e duas mil religiões há no mundo, sem que estes números ofereçam alguma precisão. Há países onde são milhões os seus deuses. Somos bilhões de pessoas, não apenas vivas e contadas pelos modernos censos e avaliados pelas estatísticas, mas todas aquelas bilhões de pessoas que já existiram neste mundo, cheio de religiões, cheio de personagens, cheios de medos, anseios, necessidades, sonhos e sobretudo crenças.

Somos seres distintos dos animais, a quem Darwin classificou e qualificou de irmãos remotos, ancestrais não evoluidos, o que na concepção judaico cristã, e por via indireta também, islâmica, torna-se uma brasfêmia, pois implica em duas afirmações antagônicas: Ou o homem, feito à imagem e semelhança de Deus, e nesse caso, advindo de uma ameba evoluida, torna o Seu Criador outra ameba, para ratificar esta afirmação mosaica, ou então, mata o Criador com um golpe único de uma lâmina mordaz oculta sob o manto da ciência.

Mas não é tão simples assim, pois desta forma estaria matando também a essencia destas bilhões de pessoas que um dia nasceram, foram amamentadas e acalentadas, receberam nomes, foram chamados de filhos e amigos, ou mesmo inimigos. Tiveram dores, alegrias, se ajuntaram em duplas e reproduziram outros filhos a quem amamentaram e os viram andar pela primeira vez, os encaminharam para a vida, ensinaram a eles lições e os protegeram o quanto puderam dos perigos que o mundo já oferecia desde então.

Estas mesmas bilhões de pessoas, que ao seu tempo, lugar e modo, se ajuntaram em grupos, bandos, tribos, clãs ou fraternidades,quase sempre o fizeram em solene reverencia a algo em comum, misterioso e invisivel: o seu medo. Mais do que a alegria, a esperança, o companheirismo, o medo sempre uniu as pessoas, porque medo só é fracasso, mas medo em conjunto é uma causa. Um partido. Uma religião (Não podemos confundir as religiões que nasceram a partir do medo da morte e desgraças, cujos destinos eram confiados à sapiência dos feiticeiros e sacerdotes, com aquelas criadas a partir da contemplação e busca de respostas para os mistérios da natureza humana).

Temos no entanto duas teologias distintas nesse raciocínio: uma que cria elementos e formula conceitos a partir de sua própria interpretação de fenômenos ligados às forças da Natureza, a teologia de valores extrínsecos, e outra, que trabalha soluções que mesclam atitudes reais intrínsecas, inerentes ao próprio indivíduo e que dá resposta às suas questões íntimas no tocante à morte, ao sofrimento, e relativas à paz de espírito, essencial a todo ser humano.

São aparentemente apenas formas de cultuar aos deuses, cujos fenômenos da natureza se assemelhavam aos seus medos ou às suas aspirações, transformando “deus” em “Deus”, porquanto passa a ser pessoal essa crença, nascendo sempre de forma pedagógica, seja punitiva ou contemplativa, mas única. Nascem então bilhões de deuses moldados à forma e semelhança do homem, porquanto atribui a si culpa e pequenez diante do incompreensível e icognoscível, mas que vê nestes deuses distantes a resposta para as questões que o caminhar da vida lhe permite formular. Não há respostas, apenas olhares rumo ao infinito em busca de nada, na ânsia que assuma a divindade criada, caráter antropomórfico, para que possa compreendê-lo e criar uma proximidade segura até que a morte os separe.

Já no pensamento judaico cristão, em que o Homem, criado à imagem e semelhança de Deus, nada pode fazer para encontrar esse Deus, não pode mapear nem rastrear Seus caminhos, fica uma possibilidade única de contato com a divindade: encerrar a busca e desixar-se encontrar por Deus. Não compete ao homem correr, mas parar. Não compete ao indivíduo formular imagens ou essencias, moldar o caráter e as características que poderia ter o seu Deus Criador, mas em simplesmente permitir-se envolver pela bondade desse Criador, que o gera a partir do nada, e que com um sopro o faz andar, pensar, sorrir, chorar, deitar, levantar ou simplesmente existir e ser completo em cada etapa do seu caminho.

Se de um lado, caminhamos pela mão do tempo e da história, e encontramos um universo de bilhões de pessoas que buscaram as mesmas coisas, somos levados a pensar e temer que somos mais uma delas, diante das tantas outras bilhões que estão por vir, e formularem as mesmas perguntas, e desejarem ser únicas, como desejamos, porque de nada vale para cada uma delas, e eu e voce, inclusive, que sejamos formiguinhas de contemplação do Todo Poderoso em sua enfadonha tarefa de absolver os inocentes e punir os culpados até que o sol se apague e tudo não tenha passado de uma fração de tempo na eternidade. Ou se de outro lado, sejamos sim, uma das bilhões de pessoas, com nome e sobrenome ( nome de família, o que diz que tivemos uma um dia), e historias a contar, mas alinhados numa caminhada com um Deus amigo, de preocupações reais com as minhas preocupações e suas reais, com empatia e simpatia para com o tropeçar continuo desses pequeninos que titubeiam no caminhar, e que não me faz correr atrás de suas pegadas para que eu O encontre, mas que segue Ele então, nas minhas próprias pegadas, ao mesmo tempo em que prepara veredas que me esperam, e que me sutém nessa jornada, e que me abraça em minhas mágoas, e seca as minhas lágrimas, e que guarda o meu tesouro, que sou eu próprio, para que mesmo em chegando o descanso da morte, possa ser encontrado intacto e perfeito, na manhã da ressurreição e abraçá-lO, conhecê-lO, ouvir a Sua voz e desfrutar as delícias que me prometeu.

Tenho saudade deste Deus e desta Teologia, que me dispõe na segurança de uma esperança que me faz desejar continuar a jornada sem olhar para trás, exceto para que lembre dos feitos de Sua bondade e da beleza de Seu caráter, cuja luz deseja espelhar em mim, pelo modelo que me fez conhecer, Seu filho Jesus.

Tenho saudade desta Teologia que me permite saber que em bilhões, eu sou único, mas que como único, só sou completo se com estes bilhões estiver o meu coração. “Ama ao teu próximo como a ti mesmo” pode ser traduzido também em “ama aos bilhões de filhos de Deus com tal intensidade, para que te sintas amado bilhões de vezes mais pelo teu Deus”. Muda o sentido da expressão. Multiplica em infinitas vezes esse amor, e que minha fé me diz, que é apenas uma centelha, uma infinita quantidade de amostra do amor incontido e incontável que o Deus que caminha por entre bilhões de pessoas, continue firme ao meu lado.