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Tendências e Empreendedorismo - Gramado como Modelo Palestra

segunda-feira, setembro 10, 2012

TEORIA DA CRIATIVIDADE


TEORIA DA CRIATIVIDADE
Paulo Cardoso
1 – O vazio e o objetivo
                                       Somos cercados pela constante necessidade de inovar coisas, inovar os sonhos, inovar a vida. Só a mediocridade é capaz de frear nosso movimento em contínua busca do desconhecido, seja ele estético, prático, físico ou mental e até mesmo espiritual. Platão afirmava que “tudo flui”, e nesta fluência constante, nossa inquietude é capaz de nos transformar a olhos vistos, alguns, ou com serenidade, outros, porém todos nós somos transformados. O tempo é o maior agente dessa tarefa e não importa o quanto façamos, seremos modificados até o dia em que nossos passos nos levem para o repouso. Até lá, indefectivelmente somos mutáveis e mutantes  involuntários.
                                       Algumas pessoas no  entanto tendem a se tornarem agentes e não objeto das mudanças, uns mais e outros menos, moderadamente. E são estes agentes que proporcionam o movimento  do mundo no que tange ao domínio do homem  sobre as coisas que o cercam.
                                       Mesmo nos fenômenos da Natureza, tem o homem sua participação: no clima, na vegetação, na composição química do ar que respiramos,  no modo com que nos locomovemos, nas coisas que ingerimos e em consequência disso, com nosso bem estar físico, mental ou espiritual. São as decisões de transformação do homem que o faz plantar certo tanto para que colha outro tanto a mais,  ou buscar meios que se plante menos e colha muito mais que antes. Descobre e produz veículos que nos levem mais rápido para chegarmos antes a lugares que nunca imaginávamos poder ir, mesmo que com isso percamos a oportunidade de apreciar a paisagem e sentir os perfumes do caminho. Mas isso já é outro assunto. Importa aqui saber que tem o homem, que temos nós este poder de transformar o que foi criado, dar novas formas, multiplicar, reduzir, acoplar, rebaixar, levantar, reforçar, enfraquecer as coisas e por este meio nos tornarmos participantes cooperadores do processo criativo de D’us.
                                       “Façamos o homem à Nossa imagem e semelhança”, diz-nos respeito à inteligência, ao Livre Arbítrio e à capacidade de ver além do nos mostram nossos olhos.  Reconhecendo que somos feitos à imagem e semelhança de D’us, nos capacita a caminhar e  criar aquilo que seja aceitável, possível e necessário. É aqui que encontramos o Design, como instrumento de modificação e aprimoramento das coisas que tornam o mundo aceitável enquanto mundo presente.
                                       É tarefa de o designer fazer uma leitura permanente do mundo que o cerca e incessantemente  buscar soluções que tornem o mundo um pouco melhor. Não temos a competência de “salvar o planeta”, como querem muitos e acreditam alguns, mas temos a capacidade de tornar suportável e dar qualidade de vida aos que vivem no mundo, começando por aqueles que vivem junto de nós.  É objetivo de o designer realizar aquilo que não conseguiram os alquimistas malucos que sonhavam transformar chumbo em ouro por meio de conjurações estapafúrdias, mas por meio de pequenas modificações simples do cotidiano, possam tornar melhor o jeito de ser e viver das pessoas.
                                       A Torá, composição dos cinco livros de Moisés, tem em seu corpo literário, alguns espaços vazios entre uma palavra e outra, em determinados trechos. Estes vazios são um mistério para os estudiosos, que creem serem estas lacunas um compêndio de mistérios que D’us os fará conhecer  nos dias que antecedem à vinda do Messias. Semelhante aos vazios da Torá, nossa vida é repleta de vazios que podem ser preenchidos pela imaginação criadora do designer em sua missão de desvendar mistérios em cada página em branco de sua prancheta de trabalho.



2 – Observando o inusitado
                                       Tenho ministrado cursos em diferentes lugares do Brasil eu fico surpreso com a capacidade criativa das pessoas que encontro. Porém, elas não sabem disso e é necessário um trabalho de “desconstrução” de preconceitos sobre criatividade nas primeiras horas de curso, para que possam descobrir que criar, buscar ideias, não é um “dom de poucos iluminados”, mas uma possibilidade de todos os que conseguem se desamarrar do velho conceito que afirma: “criar é para malucos”.
                                       Certo dia, Jesus caminhava com seus discípulos e encontraram um homem que era cego desde seu nascimento. Tendo sido chamado pelo homem e solicitado que o curasse, Jesus não teceu nenhum discurso, não fez descer fogo do céu, nem fez nada que parecesse manifestar Seu poder como O Messias. Apenas se abaixou, recolheu um pouco de terra com a mão, cuspiu sobre ela, amassou e usando esta lama incomum, aplicou sobre os olhos do cego.  Pouco depois, tendo a lama secada, caíram duas cascas, como se fossem escamas dos olhos daquele homem, que imediatamente, passou a ver.
                                       Somos semelhantes àquele homem. Nascemos livres e esta liberdade nos permite balbuciar o que gostaríamos de dizer, rir daquilo que não compreendemos e chorar diante das coisas que não concordamos. Somos espontâneos. Livres. O amadurecimento, no entanto, gera obrigações e restrições pontuadas pelas regras que nos são impostas. Ao pronunciarmos as palavras, não o fazemos como fazem os adultos, corretamente, mas como é próprio dos bebês, usamos uma linguagem simplificada, cheia de dislalias, trocamos as letras, acentuamos ou cortamos sílabas e desta forma nos comunicamos. No princípio, os adultos fazem um esforço excepcional para nos compreenderem. Porém, à medida que o tempo passa, se aborrecem disso e nos forçam a que falemos do seu jeito. São as dores do crescimento. Comunicamo-nos melhor. Fazemo-nos compreender melhor, porém, assumimos também a identidade social e perdemos nossa identidade nativa. Perdemos a espontaneidade. Deixamos de ser criativos para nos tornarmos iniciados. Abandonamos e nos distanciamos da genialidade criadora para nos integrarmos à mediocridade copiadora. Tornamo-nos preguiçosos em criatividade, porque já há tantas coisas preestabelecidas, tantos padrões à nossa volta, que se torna mais confortável que prossigamos no vácuo desta inércia criada, a frearmos o passo, olharmos à volta e criarmos nossas próprias respostas aos vazios que percebemos.
                                       Nosso mimetismo se dá exatamente pela observação do que nos impressiona ( para o bem ou para o mal) e na repetição orquestrada daquilo que nos facilita a comunicação e o viver, o nosso deslocamento no meio. Por exemplo:  a criança vê a mãe limpando a casa. Em pouco tempo ela estará com um pauzinho ou um objeto qualquer que tenha vaga semelhança com os instrumentos de limpeza da mãe, empregados aqui e ali. Neste processo, mesmo imitando o que viu, ela cria artifícios para que se objeto real se torne o utilitário imaginário semelhante ao que a mãe emprega em sua tarefa e assim, do seu jeito, ele sintetiza a adaptação, que nada mais é do que a recriação ou releitura de sua percepção sobre as coisas presentes.
                                       Penso que nascemos criadores e não somos acomodados nem mesmo  nas primeiras horas do dia. Somos criadores extrovertidos até o ponto em que as demais criações nos sufoquem e nos intimidem, nos tornando críticos e tímidos demais para nos denominarmos assistentes de D’us na continuidade da criação. Uma prova disso é a sequencia matemática de Fibonacci, que começa em passos que até um bebê pode dar: 1, 1, 2, 3, 5..., mas em determinado ponto da vida são equações astronômicas e incalculáveis, nos mostrando que mesmo que andemos um passo, sempre teremos outro mais à frente, conectado com nosso passo atrás.



2 – A Criatividade natural e o contra senso da educação
                                       Desenhar é um dos componentes do Design, é sabido por todos.  Uma criança desenha com naturalidade até os oito anos, aproximadamente. E com facilidade podemos compreender o significado de suas grafias. Traços simples, sem preocupação estética, antes, tem o propósito de comunicar um conjunto de percepções alusivas ao seu pensamento, aos seus sonhos, medos, inclinações afetivas ou simplesmente descrever o ambiente. A partir disso, começa a se tornar crítica com os traços, as cores, as semelhanças. Toma os adultos que, por alguma razão ou coincidência desenham (em seu conceito) melhor que ela. Passa então a competir e nessa competição desnecessária, vê-se encurralada entre aquilo que demonstra seu espírito e aquilo que deve ser  exposto, com o grau de perfeição exigida, em seu entender, em paralelo com o que lhe é também exigido quanto a comportamento, linguagem, postura social e outros parâmetros que a encaminham ao modo adulto de ser. Mudar isso significa deixar sua zona de conforto, pois naquele momento já percebeu também que desenhar e criar, são atividades relacionadas ao lazer e não às necessidades premente da vida, o que já começa a entender (falar correto, respeitar os mais velhos, cumprir horário, etc.) Aqui entendo como “zona de conforto” a atitude de perceber  cumplicidade quando se define como “incapaz de desenhar, tanger instrumento musical ou exercer qualquer atividade ligada ao intelecto criativo, menos cartesiano”, sua determinação em desistir do processo criativo, assegurada da crença que “criar é pra doido” e isso lhe permite ser omissa em tais processos, com anuência dos protetores.
                                       Esta visão medieval ainda, infelizmente, determina o cotidiano das pessoas em sua ampla maioria e é aqui que a “Teoria da Criatividade” (TC), se torna a “Teoria da capacidade relativa”, isto é, assegura que tal como a definição de espaço e tempo de Einstein associados consegue formatar a existência  das coisas, a TC determina a libertação destes paradigmas e faz uma catarse criativa, como uma limpeza de dutos por preenchimento de líquidos purgativos, destrava novamente o processo criativo.
                                       Não é necessário ser criança na idade, mas é necessário ter a pureza criativa de uma criança, tal como desenhou Jesus, a necessidade também de uma catarse espiritual de purificação para que voltasse o homem maduro à pureza original de um pequenino. É desta forma que buscamos a interação entre o educando e o propósito, não focando no fim como um meio, mas no princípio como um fim. Sem uma revisão crítica no ambiente racional não é possível esta catarse.
                                       O processo criativo é bem mais que ensinar e aprender a “fazer coisas” ou “criar coisas”, mas fundamentalmente um meio de libertação das amarras criticistas e contextuais, encaminhando para uma varredura na forma, dando surgimento não mais à forma, a regra, mas à continuidade. Não se trata de um anarquismo, mas de um retorno ao princípio criador, princípio gerador de inovação, sobretudo de expressão, de continuidade da expressão  dos sentidos aliados às necessidades exteriores, de valor extrínseco ao indivíduo. Aquilo que em criança demonstrava em duas ou três dimensões com as mãos as coisas que não tinha capacidade neurológica  para expressar em palavras nesta fase, a criança montava em massinha de modelar, desenhava e coloria num papel de pão e assim comunicava sua vontade. A imagem falava pelas mil palavras necessárias à comunicação. Torna-se aqui então o objeto um veículo de comunicação, mais do que uma expressão estética. Aqui a diferença então entre o estado adulto e aquele manifesto em criança: enquanto a criança manifesta sensações pelo traço e objeto, caminha com as sandálias da arte. Na fase adulta, o objeto é o meio de expressão aliado ao que aprendeu neste amadurecimento, onde tudo deveria ter um sentido, uma função, suprir uma necessidade. Não é certo nem errado encontrar uma qualificação para este objetivo, mas apenas uma constatação e esta constatação é o ponto de apoio para que a alavanca das necessidades humanas possa mover o mundo enclausurado numa mente criativa.


3 – Coletar e armazenar ideias.
Pacard

O primeiro engano de domínio público é aquele que o designer “tem” idéias e que precisa de “inspiração” para criar. Posso afirmar com segurança que nenhuma inspiração é necessária para a produção de criações, de inovação, assim como muitas vezes a própria inspiração, da forma que conhecemos, pode atrapalhar no processo criativo, pois devem ser consideradas todas as variáveis que orquestram a geração de um design. Design pressupõe um foco criativo orientado a um propósito específico: gerar um produto seja em ele em duas ou três dimensões. Seja ele gráfico impresso ou virtual, será ainda assim um produto, cujo propósito seja comunicar ou proporcionar conforto ergonômico, estético e funcional ao objeto proposto.
Desta forma, não pode o designer deitar-se numa rede à sombra e esperar que uma luz transcendente o inspire e tal como um visionário, gere um espasmo de genialidade absoluta. Quando isso ocorre, não posso acreditar que foi simplesmente uma ideia fortuita, sem que a precedesse um incansável cordel de pensamentos, de pesquisas, um “brieffing” de necessidades do cliente, com um “check-list” imenso à frente e uma vontade enorme de gerar algo que promova melhor qualidade de vida ao seu usuário.
O processo criativo pressupõe o encontro de necessidades entre o criador e o consumidor, tendo como elo o produto que, de um lado, atende às necessidades de quem o adquire, e de outro lado, promove a manutenção e gera riqueza à quem o produz, não apenas ao proprietário da indústria que tem seu merecido lucro, como também gera riqueza social, com empregos, impostos, distribuindo esta riqueza na comunidade onde esteja instalada sua companhia. Tendo essa premissa, o design cumpre um dos mais importantes laços da cadeia produtiva e social. Deve, portanto ser visto sob este prisma o meio criativo e não como mero capricho do departamento  de marketing ou de criação.
Há, no entanto um hiato existencial entre um departamento industrial e um bureau de criação. Aparentemente não há assimilação entre ambos, pois enquanto o primeiro, pressupõe a “seriedade” sisuda do barulho de máquinas e homens e mulheres atarefados em cumprir metas de qualidade e produtividade, no outro lado está um ambiente extrovertido, democrático, multicolorido, emaranhado de “malucos” filosofando sobre conceitos, forma e função, matizes cromáticos, ergonomia, usabilidade, “amigabilidade” e uma infinidade de termos que jamais serão mencionados no processo produtivo e muito menos ainda dentro da casa do consumidor, que no máximo dirá que é confortável ou desconfortável, cara ou barata, feia ou bonita, e nada mais.
No entanto este entrelaçado de caminhos e etapas é importante tanto para o processo criativo quanto para o produtivo e  para o consumidor, objetivo maior de toda criação e produção, porque é no processo criativo que são exaustivamente debatidas todas as nuances e todos os detalhes que irão permitir que haja fluência na fábrica, giro rápido na loja e finalmente cumpra sua função dentro da casa do consumidor. Este ciclo então não pode estar afeto aos delírios de visionários que esperam luzes no horizonte para que possam criar.  O produto só pode, por estas singularidades, brotar de um diligente trabalho de pesquisa, avaliação e testes com rigor científico e empacotando este complexo mecânico e cartesiano, o senso estético e inovador proveniente da genialidade acoplada à dedicação e experimentação contínua do criador, o nada maluco designer.


4 – O Design como transformador social
                             Pouco se vê o design como modificador de estruturas da sociedade. Ao contrário disso, o design é conceituado no imaginário popular como um “enfeite necessário ao produto” objetivando promover crescimento nas vendas, e o consumidor, por seu lado, faz uma leitura mais individualista do produto. Gosta ou deixa de gostar. É confortável ou desconfortável. Exótico ou inovador.  Sempre agrega,  na opinião dos fabricantes, que não deixa de fazer sentido, porque ele é “sua majestade” o consumidor. Porém não há um conceito de real utilidade quanto à inovação. Até mesmo na denominação técnica, a “inovação” é chamada de “tendência”, “moda” “valor agregado”, mas sempre como um adjetivo, um aditivo que possa “dourar a pílula” e fazer presença nas vitrines.
Umas coisas eu tenho percebido ao longo dos anos no meio industrial: em larga escala, no mercado da classe média baixa, e que representa a grande fatia de consumo brasileiro, o design em si pouco agrega às vendas em grande volume, mas o motivo é bem fácil de entender: Não é uma tarefa simples nem barata a transição de estilos, de tendências dentro do segmento C e D. Mesmo B há certos limites para a inovação. Trocar o desenho de uma grande indústria pressupõe uma imensa transição interna e externa, começando pela matéria prima, escolhendo novos fornecedores, testando qualidade dos materiais, recebendo relatórios de análises quando é o caso de utilitários com normas ergonômicas e funcionais, testes de resistência e segurança no tocante à mobiliário infantil ( que por si mesmo já é um capítulo à parte no mobiliário. Ninguém quer fazer, ninguém quer vender e ninguém quer comprar).
Trocar um produto de linha significa trocar, em muitos casos, de equipamento, da planta industrial, de novos produtos químicos, de novos cursos de capacitação da equipe. Este é outro problema: as indústrias não gostam de investir em capacitação, porque assim que o funcionário se sentir mais bem treinado, ele pede aumento ou acaba sendo levado pelo concorrente, ou outro expoente disso: os funcionários não gostam de inovação, porque têm medo de não darem conta de aprenderem o novo jeito de trabalhar e se tornarem dispensáveis à empresa. Muitos acabam, com isso, até mesmo boicotando o trabalho de inovação. Não foram poucos os casos que tive nestas circunstâncias.
                             O “novo” assusta. O “novo” intimida, porque pressupõe que tudo aquilo que você fez até aquele momento tenha sido errado e que a partir desta nova situação você encontrou o “paraíso perdido”. Não é assim que acontece, mas muitos profissionais se vendem com esta imagem, de “libertadores”.  Do lado do empresário não é diferente, porque por consenso de técnico de futebol medíocre, “em time que está ganhando, não se mexe”. Mas é claro que se mexe sim. Não entendo nada de futebol, mas a realidade está abarrotada de exemplos de pessoas que não quiseram mudar no momento oportuno, nem no momento necessário, acabaram por tentar mudar no momento de desespero. Inovar não pressupõe apenas mudar radicalmente as coisas estabelecidas, mas permitir que haja fluência no processo criativo e quando falo em “processo criativo”, estou necessariamente falando de pessoas. Fábricas não inovam. Máquinas não inovam. Escritórios ou corporações não inovam. Quem inova são as pessoas. Sempre. Isso não se resume ao setor de móveis, nem à decoração e nem mesmo ao design. Inovação é uma constante da existência humana, da necessidade do ser humano de experimentar, de buscar uma visão de outro ângulo do problema, ou da solução do problema.
                             Durante o período em que tento mostrar aos meus alunos o processo criativo, eu peço que cada um desenhe uma árvore, livremente. Ao término da tarefa, percebo que a totalidade dos alunos desenhou uma árvore olhando do mesmo ponto de observação: de baixo.  Nunca encontrei alguém que desenhasse uma árvore vista de cima. Depois que explico o dilema, é que todos se dão por conta que poderiam ter feito isso. O dilema do “ovo de Colombo”. A síntese da aula é mostrar que criar não é difícil. Inovar não é difícil. É apenas mostrar uma solução, tendo como ponto de partida o mesmo problema, mas por outro ângulo. Um ângulo inusitado.  Desta forma, o criador, o inovador é antes de tudo um “revolucionário”. Aquele que não tiver coragem de criar uma revolução com suas ideias, com seu trabalho, com suas soluções, não serve para ser designer.
                             Criação é um negócio, um empreendimento como outro, mas não qualquer, porque a grande maioria dos empreendimentos, das profissões, dos negócios, tem metas e padrões definidos. Existem até mesmo Leis que regulamentam o exercício destas atividades. Existem valores preestabelecidos que permitem que tenham tabelas a seguir. Há modelos de formatação da gestão destes empreendimentos que podem ser modeladores e em qualquer parte do mundo, resguardados os valores culturais e nacionais, mantém o mesmo formato. Uma roda é uma roda sempre. Ela pode ser orientada a servir a um automóvel, ou a um prato ou outro objetivo qualquer. Mas será sempre uma roda, um círculo em três dimensões, que pode ter um comparativo de qualidade, dureza, valor e preço de venda. Mas uma criação não. Ninguém abre um livro de regras para criar algo. Ninguém calcula nada para criar algo. Nenhum criador consulta planilhas do governo para criar algo. Ele simplesmente cria. Depois de criado, o objeto, o empreendimento deverá ser formatado para atingir seus objetivos. Poderá ser moldado às regras, Leis ou valores desejados ou propostos. Mas aí já foi criado. Isso é criação. Chegar ao tudo partindo do nada.
                             O tema deste tópico está implícito nesse contexto onde busquei demonstrar que, se de um lado, a criação como negócio inserido nas corporações já estabelecidas não obtenha o valor que lhe seja devido, de outro lado, temos incontáveis modelos testados e aprovados através, e principalmente do trabalho de Organizações Não Governamentais (ONGs).  Há também, excelentes resultados obtidos por projetos do SEBRAE ou projetos de instituições educativas, que trabalham com comunidades carentes, comunidades ribeirinhas, até mesmo dentro do sistema prisional, onde os apenados trocam dias de trabalho por redução de pena. Enfim, há uma grande quantidade de projetos que só permitiu-se um bom retorno porque se juntou a criatividade inata a muitas populações, culturas ou comunidades. Neste particular, o Brasil é riquíssimo. Tenho visitado o interior do país através de minhas consultorias e busco sempre, nestas oportunidades, visitar os arredores das cidades onde estejam localizadas as fábricas em busca de amostras da cultura local, porque meu trabalho tem um vetor direcionado ao “fator local” (expressão criada por tese de Mestrado de meu amigo Jorge Montaña), onde procuro sorver e agregar elementos desta cultura e criatividade locais aos produtos que crio, ou aos projetos onde participo como educador. Cada viagem é uma descoberta que por si só, permitiria trabalhar por anos a fio apenas agregando um viés industrial ao rico artesanato regional. Neste caso, a criatividade inata não é suficiente, pois ela não gera riquezas.  Aqui eu traço uma linha divisória entre, ser criativo no âmbito daquilo que faz porque faz bem feito e mantém os padrões já outrora criados, e seja esta uma das variáveis de manutenção cultural daquela região, e ser criativo em reconhecer aqueles valores e integrá-los ao produto em série e permitir que mais pessoas tenham acesso àquele valor ou bem regional.  Neste caso há dois valores de criatividade distintos, que devem ser considerados, porque não posso considerar apenas criativo o designer, o artesão, o artista que desenvolveu seu talento e é criativo naquilo que faz, mas tenho que me relacionar com o mesmo entusiasmo ao criativo empreendedor que viu naquele valor um valor a ser multiplicado.
                             Dou exemplo disso: em 1989, ao retornar de uma feira em Milão, dei a uma empresa um folder contendo um conjunto de peças de determinado estilo. Vi naquilo apenas uma informação dentro de um contexto dentro do cenário de informações que desejariam obter de mim naquele momento. Não fui criativo nem eram criativos os modelos que entreguei, porque eram clássicos apenas. Criativa foi a pessoa que viu naquele estilo de produto uma oportunidade e a transformou num negócio de milhões nos anos que se seguiram. Segue-se daí que a criatividade é uma esfera com muitas possibilidades em uma sequência de faces sem inicio e sem fim, que se mostra melhor de acordo com o posicionamento da luz em seus hemisférios.



5 – Os caminhos do design como profissão
Karim Rachid  diz que as pessoas não sabem definir o que é design, porque confundem o fato de desenharem uma releitura de um castiçal do século 17 com design e ele sentencia que isso é “stylling! E não design. Rachid ainda ataca esta miscelânea de profissões que de um dia para outro simplesmente foram transformadas em “design”.  Um pizzaiolo criativo de tornou um “pizza designer”. Um cabeleireiro é hoje um “hair designer”. Um confeiteiro é um “cake designer” e assim por diante.  Karim diz ainda que hoje 99% do que o setor de moda faz é “stylling” e não design, porque design pressupõe alterar costumes, andar pra frente. “A mulher de hoje precisa de bolso para o smartphone, o que uma roupa channel não prevê, então redesenhar uma função, isso é design. O que passar disso, é “stylling”.
Eu não quero ser tão radical quanto à escolha da definição profissional, pois a primeira premissa para o designer é a quebra de paradigmas, de preconceitos e no momento em que eu cercear alguém de se definir nesta ou naquela escolha de sua própria profissão, estarei abrindo caminho para que façam o mesmo comigo. Claro que deveria ser assim do outro lado da mesa então. Eu poderia me intitular “arquiteto”, porque eventualmente desenho uma casa, ou “medico”, porque recomendo a um amigo que sofre de azia, que tome suco de limão com água. Poderia me declarar “taxista”, levo um amigo de carona no meu carro, enfim, são tantas vezes que damos opinião, prestamos algum serviço eventual que, de outro modo, seria invasão profissional a outras pessoas. Claro, que isso acontecendo com certa regularidade e a partir do momento em que eu cobre por isso, ou estabeleça um patamar de submissão de outras pessoas diante de minha graduação, mesmo que não seja naquilo que estou  opinando, eu estarei desrespeitando a Lei e invadindo o espaço de domínio profissional de outras categorias.
                             Mas não é isso que fazem com o design? Não é nisso que transformam qualquer ato de criatividade (ou de aberração) estética imediatamente em “design”? Não somos confundidos com arquitetos, quando fazemos interiores? Não somos denunciados aos Conselhos de Arquitetura e Engenharia, quando uma placa com nosso nome e endereço aparecem numa obra onde se suspeita que tenhamos feito mais do que apenas pendurar cortinas e deslocar o sofá para mais perto da janela? Mas e por que o contrário não acontece? Por que esta submissão tão dócil quando somos invadidos por profissionais apócrifos todos os dias e nos calamos? E pior que isso tudo ainda é nos calar quando nos chamam de “artistas”. Aliás, tem designer que pensa que é artista. Tem produtos que são excelentes para vencer exposições de arte, mas depois que saem de lá, a tarefa mais difícil é encontrar alguma utilidade para aquelas traquitanas.
                             Temos que legalizar o design com urgência, o que graças à D’us e ao Deputado Penna (PV, SP) que foi sensível aos apelos dos designers e fez votar na Câmara (por enquanto em suas comissões internas) a Lei que regulamenta a profissão de designer. Já existe junto ao MEC, mas é invisível junto ao MT. Perante a legislação trabalhista, um designer é ilegal. Uma meretriz não. Porém, mais urgente do que legalizar, regulamentar, frear abusos, é compreender o que é de fato o design.  Tirar o design do meio acadêmico, do meio intelectual, da grandes corporações, do setor de publicidade e seus correlatos, e leva-lo ao público. Levar o que é o design, como o design interfere na vida das pessoas desde a mais tenra infância, dentro das escolas, dentro das comunidades, sejam elas carentes ou não e permitir que o design deixe de ser aquela profissão dos sonhos, que dá certo status, e passe a ser um produto de consumo cultural acima de tudo.